domingo, 17 de maio de 2009

A revolução dos moleques

Como o comportamento dos jovens na web influencia o modo como consumimos, trabalhamos e nos divertimos.

Foi num movimento tão cotidiano quanto subir as escadas de casa e observar o comportamento dos filhos que o canadense Don Tapscott extraiu as bases de seu livro mais recente, “Grown Up Digital: How the Net Generation is Changing Your World” (ainda sem versão brasileira). Os dois adolescentes, hoje com 23 e 26 anos, são legítimos representantes da geração net, gente que fica mais tempo na frente do computador do que da TV e que está mudando o jeito como trabalhamos, consumimos e nos relacionamentos. O consultor e autor de Wikinomics estará no Brasil em agosto para o INFO CIO Meeting. Veja o que ele contou:

INFO: Como a geração net está mudando o mundo?
DON TAPSCOTT: Essa geração de jovens cresceu com acesso farto à internet. Eu me considero um imigrante digital, eles são nativos. Pensam de forma diferente e agem de um jeito colaborativo naturalmente. Vivem em função de inovação, criatividade e customização. Estou convencido de que dentro dessa nova cultura está um novo jeito de trabalhar. Se ouvirmos esse pessoal, eles nos mostrarão como mudarmos nossas empresas — e para melhor.

Como as empresas estão se virando para atender esse desejo pela customização?
A primeira coisa é não se focar só nas vendas. É preciso engajar as pessoas em torno das marcas no lugar de simplesmente tentar empurrar produtos. Em todas as partes da economia existem oportunidades para engajar os consumidores por meio de opções de customização. Um exemplo é a loja Threadless.com, que permite que os clientes façam o design de suas próprias peças de roupa. Outro caso emblemático foi um concurso para que os consumidores criassem um comercial do salgadinho Doritos, e o vencedor teria sua obra exibida no intervalo do Super Bowl, o principal evento esportivo dos Estados Unidos. Do lado negativo, vemos as gravadoras que estão processando crianças por aí, quando deveriam incentivar seus clientes a remixar músicas.

Indústrias tradicionais, como a automotiva, podem atender a demanda de produtos personalizados?
O caminho para a indústria automotiva pode ser copiar o que já tem sido feito por empresas de calçados. Eu mesmo criei um par de sapatos para golfe usando o site da Nike. No caso dos carros, eles precisam deixar que o consumidor se envolva antes no processo de criação, para determinar características do carro. Eles também poderiam abrir as APIs que estão presentes nos computadores de bordo dos carros. Isso criaria espaço para que os consumidores usassem os carros também como ferramentas para diversão, aprendizado e trabalho. Afinal, as pessoas passam bastante tempo dentro dos automóveis e esse período poderia ser mais bem aproveitado.

Qual sua opinião sobre quem debocha da utilidade das redes sociais, chamando-as de “social not working”?
É verdade que os jovens gastam muito tempo no Facebook durante o trabalho, mas isso não é uma razão para bloquear o acesso a esse tipo de site. Não é um problema da tecnologia, e sim de gerenciamento. Eles precisam de atribuições mais claras, avaliações de performance e um workflow eficiente. Bloquear uma ferramenta social desmoraliza o funcionário e ele simplesmente vai usar outro site parecido. As redes sociais estão se tornando uma espécie de sistema operacional para os negócios, por isso as empresas devem abraçar esses serviços como um local para a inovação e a análise de desempenho dos funcionários.

É errado dizer que os gadgets se transformaram nos grandes ídolos dessa geração?
Esses aparelhos são as chaves de acesso dos jovens para o mundo. Não são apenas aparelhos, são janelas para encontrar os amigos, ouvir a música e consumir cultura pop. Os aparelhos são também ferramentas para o trabalho e para o aprendizado.

A geração net ameaça a sobrevivência dos jornais e da TV?
Os jornais e a TV precisam mudar radicalmente, pois a web é uma mídia muito melhor para distribuir notícias e conhecimento. Além disso, a internet permite que um cidadão normal passe da posição de receptor de informação para a de produtor de conteúdo. Todos podem colaborar em torno das notícias, fazer comentários e, dessa forma, mudar o mundo. O modelo de transmissão de mão única da televisão está se acabando, e o mesmo vale para os jornais.

O sistema educacional atual é velho demais para essa geração?
Sim, o modo tradicional de educação é inapropriado para eles. Ter alunos isolados em suas tarefas e um ambiente centrado apenas no professor, com uma aula igual para todos, não funciona mais. O papel do professor não deve ser o de um transmissor de informações. Hoje os garotos crescem colaborando entre si e precisam interagir. O modelo atual é errado, precisa mudar e não vejo uma força de transformação mais poderosa para isso do que a força dos próprios estudantes.


Matéria escrita por Juliano Barreto e publicada no site da revista INFO, em 15 de maio de 2009

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